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Há uns dias tive a oportunidade de ler um texto que me deixou com a “pulga atrás da orelha”. Já afirmei em público que nutro pelo autor uma honesta e sincera simpatia, dos tempos em que ele era jogador de futebol, mas ao nível da política devo dizer que não estamos, naturalmente, na mesma página e que isso não traz problema absolutamente nenhum. O autor escreveu sobre, segundo ele, “Os malabarismos de António Costa”, e eu escrevo hoje para tentar apresentar uma perspetiva (nem melhor, nem pior) diferente dos tempos do Costa.

“No passado dia 7 de novembro e após 2902 dias como primeiro-ministro, António Costa apresentou a sua demissão ao Presidente da República, em resposta à divulgação pelo Ministério Público de que é alvo de investigação do Supremo Tribunal sobre o possível envolvimento em projetos de lítio e hidrogénio. No âmbito desta investigação, Costa enfrenta suspeitas de corrupção ativa e passiva de titular de cargo político, tráfico de influência e prevaricação.”

Tiago Vinagreiro, Reconhecer o Padrão – 17/11/2023

Neste parágrafo, descreve-se de uma forma muito simplista o que se passou no passado dia 7 de novembro de 2023, provavelmente esquecendo-se de fazer o devido enquadramento no que diz respeito às posições tomadas anteriormente por António Costa em matéria de Justiça. Além disso, numa leitura meramente pessoal, penso que começar um texto desta forma identifica claramente qual a opinião do autor em relação ao potencial grau de culpa do visado… Desvalorizando completamente a figura da presunção de inocência. Sobre o legado de António Costa para o país, como em quase tudo na vida, podemos sempre tentar ver o copo meio cheio ou o copo meio vazio. Neste particular é sempre mais fácil criticar negativamente em vez de o fazer de uma forma positiva e construtiva. O que está ainda por fazer e conquistar, não é nem nunca será pouco, é, isso sim, a âncora dos que tentam agora aproveitar este momento de incerteza política, mas não esqueçamos que existem dados que nos podem ajudar a perceber que nem tudo foi bem feito, e de igual forma nem tudo foi tragicamente negativo!

Pensemos no salário mínimo que teve um aumento de 50% nos últimos anos (estes valores percentuais já quase nem se usam). Pensemos na redução do desemprego de 12.9% para 6.1%, pensemos ainda no aumento médio das pensões de 23% desde 2016… Os últimos anos entre pandemia, guerras e escalada das taxas de juro foram ultra desafiantes, mas, mesmo com este contexto extraordinário, desenvolveu-se um combate à pandemia e à inflação com apoios às famílias, pensionistas, jovens e às empresas… As creches gratuitas e os manuais escolares, igualmente sem custos, foram uma realidade. O apoio aos jovens com o IRS ZERO, a redução das propinas e uma maior aposta nas qualificações e, sobre o trabalho, Portugal continua a desenvolver uma reforma com a Agenda do Trabalho Digno.

Em suma, e apenas com estes exemplos pode-se dizer que, com António Costa como primeiro-ministro, aconteceu o seguinte:
  • 7 anos a convergir com a EU (2016-2023)
  • 10 vezes mais do que a média anual dos 15 anos anteriores
  • 2º País da UE que mais cresceu em 2022
  • Redução da dívida pública e sustentabilidade das finanças do país
  • Primeiro excedente orçamental da nossa democracia.

Nunca esquecendo que ainda falta encher uma metade, sempre preferirei a perspetiva do copo meio cheio. Poderíamos ainda falar sobre as questiúnculas da espuma dos dias, as polémicas do ministro A ou do ministro B, ou ainda do Secretário de Estado C, mas no final do dia não estaríamos a falar de nada que fosse original na nossa democracia. Eu sou ainda do tempo em que o PSD foi determinante contra a dissolução da Assembleia da República, ao contrário do que hoje faz, neste particular estará naturalmente incluído o autor do texto que fala dos “malabarismos de António Costa”.

Este é o momento em que o PS e as restantes forças políticas se acantonam para se prepararem para novas batalhas eleitorais. Os socialistas terão de decidir quem irá a jogo enquanto líder e respetivo candidato a primeiro-ministro. Tal acontecerá de uma forma natural e democrática, como é “habitual” no Largo do Rato. Já nas hostes laranjas, se pensarmos que havia a fortíssima probabilidade de Montenegro, enquanto líder, não conseguir chegar às datas previstas das próximas legislativas (2026), como é possível alguém querer convencer a população de que o PSD é o caminho certo para…

“…uma liderança comprometida com a transparência, a ética e o bem comum, tudo o que tem faltado nestes últimos 8 anos. É tempo de abraçar uma visão unida para construir um país mais próspero e equitativo. Valorizemos a participação cívica, a responsabilidade política e a colaboração entre os diversos setores da sociedade. Juntos, podemos superar desafios, fortalecer as instituições e construir as bases para um futuro mais promissor. Que esta próxima fase política seja marcada pela inovação, pela justiça social e pelo respeito pelas aspirações individuais.

Portugal, com a sua rica história e cultura, tem o potencial de se destacar como um farol de progresso e solidariedade. Vamos trabalhar coletivamente para traçar um caminho de crescimento, inclusão e resiliência. Neste momento de viragem, confiemos na capacidade do povo português para moldar um futuro onde os valores fundamentais da democracia, honestidade e prosperidade sejam as bússolas que orientam o país. A mudança está nas mãos de cada cidadão, e juntos podemos escrever um novo capítulo na história de Portugal, sem malabarismos, mas com seriedade e ambição.”

Tiago Vinagreiro, Reconhecer o Padrão – 17/11/2023

É por estas e por outras que, quando se dá prioridade a objetivos imediatos em detrimento do que serão os temas de fundo, de vez em quando as coisas nos correm mal. Reparemos que ainda por estes dias vimos o rating da dívida portuguesa ser aumentado para A3 pela Moody’s. Nunca na nossa história tínhamos conseguido ultrapassar a Espanha neste particular! Será isto também um malabarismo do Costa?! A mim, nunca me verão a defender que sou um arauto da virtude nem tão pouco a “última bolacha do pacote”, mas podem sempre contar com uma perspetiva tendencialmente diferente da maioria que habita nesta, como já alguém lhe chamou, “ilha social-democrata, neste distrito adormecido”. A mesma maioria, essa que amiúde se esquece de se olhar ao espelho quando critica o Governo Central e que não se apercebe que, quando critica o governo central em muitos momentos, está a criticar-se a si própria enquanto replicadora de comportamentos iguais.

Termino hoje com uma expressão um pouco mais prosaica, dizendo-vos que não se preocupem, estou deitado, mas estou vestido e pronto para o que for necessário…

Um forte abraço!

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