Ao longo dos anos, ouvi inúmeras vezes a frase “as crianças são difíceis”, como se fossem os pequenos os únicos culpados pelos desafios da parentalidade. No entanto, à medida que mergulho mais fundo nessa questão, começo a questionar: será que são realmente as crianças que são difíceis, ou são os pais que estão exaustos e sobrecarregados?
É fácil cair na armadilha de culpar as crianças por comportamentos desafiadores. Afinal, elas têm uma maneira única de “testar” os limites e “desafiar” a autoridade dos adultos. Mas, e se olharmos para além do comportamento aparente e nos concentrarmos nas necessidades subjacentes das crianças? Muitas vezes, os “comportamentos difíceis” são simplesmente uma forma de expressar emoções não processadas ou necessidades não atendidas.
Por exemplo, uma criança que se recusa a ir para a cama pode estar a expressar ansiedade pela separação dos pais, enquanto uma criança que age de forma agressiva pode estar em busca de atenção e validação emocional. Quando percebemos essas necessidades subjacentes, somos capazes de responder de uma maneira mais empática e eficaz, em vez de simplesmente reagir com frustração e irritação.
E quanto aos pais? É inegável que criar filhos é uma tarefa árdua e exigente. A falta de sono, as responsabilidades do trabalho, as preocupações financeiras e as pressões sociais podem deixar os pais exaustos e com pouca paciência para lidar com os desafios do dia a dia. E, no entanto, muitas vezes esperamos que ajam como super-heróis, sempre calmos, pacientes e compreensivos.
Essa expectativa irrealista coloca uma pressão adicional sobre os pais, que muitas vezes se sentem culpados por não conseguirem atender a esses ideais impossíveis. A verdade é que os pais também são seres humanos, sujeitos a todas as complexidades e desafios da vida moderna.
Então, quem está realmente cansado nesta equação? Tanto as crianças como os pais enfrentam as suas próprias batalhas diárias. As crianças estão a tentar entender o mundo ao seu redor e a aprender a lidar com as suas emoções, enquanto os pais estão a tentar equilibrar múltiplos papéis e responsabilidades, muitas vezes sem o apoio adequado.
É uma dança delicada entre atender às necessidades das crianças e cuidar do próprio bem-estar. Muitas vezes, os pais dedicam o seu tempo e energia para garantir o conforto e a felicidade dos seus filhos, mas é importante lembrar que também precisam de cuidados e apoio.
E quando chegamos à fase da adolescência, os desafios da parentalidade podem intensificar-se. Os adolescentes navegam por um turbilhão de mudanças físicas, emocionais e sociais, e muitas vezes expressam essas mudanças através de comportamentos desafiadores. Nesse período, é crucial os pais permanecerem firmes, mas também flexíveis, oferecendo orientação e apoio enquanto os adolescentes exploram a sua identidade e independência.
Além disso, a adolescência traz consigo novos desafios para os pais, que muitas vezes se sentem despreparados para lidar com questões como o uso das tecnologias, pressões académicas, relacionamentos interpessoais e identidade sexual. Nesse contexto, é essencial que os pais procurem recursos e apoio para entender e acompanhar o desenvolvimento dos seus filhos adolescentes.
Então, o que podemos fazer para resolver esse enigma da parentalidade? Em primeiro lugar, é essencial reconhecer que tanto as crianças quanto os pais merecem compreensão e apoio. Em vez de simplesmente rotular as crianças e jovens como “difíceis”, devemos esforçar-nos para entender as suas necessidades e oferecer-lhes o suporte emocional de que precisam.
Da mesma forma, os pais também precisam de compaixão e apoio. Em vez de os julgar pelos seus momentos de fraqueza ou impaciência, devemos oferecer-lhes ajuda prática e incentivo emocional. Isso pode significar partilhar responsabilidades com o cuidado das crianças, oferecer uma palavra gentil de encorajamento ou simplesmente ouvir sem julgamento.
Além disso, é importante lembrar que a parentalidade é uma jornada de aprendizagem contínua. Todos nós cometemos erros ao longo da vida, mas é através desses erros que crescemos e nos tornamos pais mais compassivos e resilientes.
Então, da próxima vez que tentarmos culpar as crianças pelos desafios da parentalidade, vamos parar por um momento e perguntar-nos: quem está realmente cansado aqui? E, mais importante ainda, como podemos apoiar-nos mutuamente para tornar essa jornada um pouco mais suave para todos? Afinal, somos todos seres humanos, que navegam juntos pelos altos e baixos da vida.
Catarina Reis Nicolau
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