No meu último artigo “Tudologia, a “ciência” mãe da atualidade” procurei refletir sobre os motivos que levam as pessoas a sentirem necessidade de expressarem as suas opiniões pouco fundamentadas sobre assuntos complexos e que não dominam.
Hoje queria escrever-vos sobre o outro lado da barricada. Ou seja, sobre as consequências de cedermos a essa pressão interna e/ou externa de nos posicionarmos “publicamente” acerca de um determinado assunto polémico ou potencialmente controverso. Algumas que destaco: desinformação, mais fake news, aumento do discurso de ódio e da polarização da discussão, descida exponencial do nível e da qualidade da conversa, invisibilidade dos discursos e das opiniões de especialistas que realmente interessam, etc. Engraçado que os títulos sensacionalistas vendem sempre mais do que os ponderados. As opiniões simplistas e falaciosas rendem sempre mais do que aquelas que são aprofundadas e bem fundamentadas. Mais views, likes, clicks, engagement, comments, retweets. Muitas vezes alimentamos este ciclo vicioso e disfuncional sem sequer nos apercebermos e, mais tarde, acabamos a ser vítimas diretas do mesmo.
O que acontece efetivamente quando cedemos à pressão de nos posicionarmos para satisfazer esta necessidade intrínseca e tão básica de pertencer a um determinado grupo, de corresponder às expectativas? Muito poucas coisas positivas e uma data de negativas, pelo menos a um nível mais profundo e a longo prazo. Porque inicialmente sentimo-nos os maiores: aqueles de quem procuramos aprovação validam o nosso comportamento e aqueles que discordam, por serem de um grupo oposto e que desprezamos, facilmente reforçam ainda mais a nossa posição.
Há muitos temas e assuntos em que não há um lado certo ou errado. E quando discutimos como se houvesse, acabamos por não ser flexíveis aos argumentos do outro, acabamos por não tentar compreender, fechamo-nos a outras hipóteses, possibilidades e a outras realidades. E isso é tão perigoso. Porque em primeira análise não nos permite evoluir enquanto pessoas e desenvolver o nosso intelecto e, em última análise, acabamos a discutir como se estivéssemos num tasco aos altos berros e a mandar todos aqueles que não concordam connosco para um sítio bem desagradável.
Sei que por vezes não é fácil manter a conversa a um nível civilizado, acreditem. Eu sou aquela pessoa que fica logo corada, suada e nervosa quando tocam em temas que me são queridos, que mexem com os meus valores e crenças mais profundas. E facilmente solto a histérica que há em mim e a racionalidade salta porta fora. Mas a verdade é que assim também não conseguimos conversar e aprender. Ninguém beneficia com este tipo de abordagem. E, portanto, há que reconhecer os nossos limites e limitações, explorar os nossos gatilhos e treinar no sentido da comunicação assertiva, e não agressiva como acontece demasiadas vezes. Eu pelo menos tenho tentado fazer este trabalho e este esforço. E tu? Vais pensar duas vezes numa próxima? Vais respirar fundo antes de começar a mandar postas de pescada para o ar no jantar de família ou nas redes sociais? Tu decides.
Inês Fonseca
Pintura de capa por Ernest Meissonier
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