Num mundo onde a procura incansável pelo sucesso impera, espreita um monstro invisível, agarrado a cada um de nós: o “burnout”. Este demónio silencioso que consome os nossos espíritos e deixa cicatrizes profundas na saúde mental, mora ali tão perto de qualquer um. Imagine-se aprisionado numa rotina que nunca abranda, com as expectativas da sociedade e do trabalho a pesarem como uma âncora, numa corrida vertiginosa contra tudo. Os dias transformam-se em noites e as noites em dias, sem descanso à vista, na ilusão de superar os limites da nossa capacidade real de fazer as coisas acontecerem. Tudo em benefício da produtividade pessoal ou profissional.
Neste turbilhão de rotina suicida, o corpo diz basta, a mente apaga-se e a alma estremece. A produtividade desaparece, a alegria desvanece e a conexão com o que realmente importa perde-se no horizonte e tudo vai por água abaixo. Agora, mais do que nunca, é fundamental compreender este inimigo invisível. Qualquer um pode ser ou poderá ser vítima das circunstâncias desta neblina stressante, pois o esgotamento pode afetar qualquer um, desde líderes empresariais, médicos, professores, simples transeuntes da engrenagem selvagem da produtividade das organizações, ou dos buscadores da perfeição pessoal. Não podemos mais tapar o sol com a peneira, pois os sinais estão aí: exaustão extrema, apatia, insónia, ansiedade avassaladora, isolamento social, problemas cardiovasculares, tudo num cocktail que pode terminar em pensamentos suicidas.
O burnout não é apenas um problema individual; é uma epidemia silenciosa que afeta toda a sociedade. Estudos e pesquisas apontam para um aumento alarmante nos casos de burnout em vários setores de atividade profissional. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), estamos perante um problema de saúde ocupacional, que afeta milhões de pessoas em todo o mundo.
Para obter uma melhor compreensão deste monstro invisível, devemos analisar as causas subjacentes que estão na sua origem. A cultura de trabalho contemporânea muitas vezes nos empurra para além dos nossos limites, incentivando longas jornadas, pressões implacáveis e a constante procura por metas ambiciosas. Estamos imersos em sociedades que valorizam o sucesso a qualquer custo, onde o equilíbrio entre vida pessoal e profissional frequentemente é deixado para segundo plano, numa agenda inexistente sobre o cuidado e preocupação das questões de saúde mental.
Está na hora de enfrentar este pesadelo, e entender o custo humano do sucesso desenfreado. Somos apenas humanos, não máquinas incansáveis. A nossa sanidade vale mais do que qualquer realização. O cansaço mental é uma ferida que não devemos fortalecer, pois a nossa saúde mental merece ser preservada e nutrida, agora e sempre, aludindo às novas gerações, que por imitação ou ignorância vão modelando comportamentos disfuncionais.
Lembramos que o sucesso não deve ser medido apenas pela conta de resultados da nossa carreira, mas também pelo nosso bem-estar emocional. O burnout é um lembrete sombrio de que, enquanto perseguimos objetivos irrealistas, não devemos perder isso de vista. É fundamental repensar as nossas definições de sucesso, sob pena de não sermos bem-sucedidos na saúde pessoal. Devemos valorizar o equilíbrio, a qualidade de vida e a saúde mental tanto quanto valorizamos as realizações e projetos profissionais.
Neste contexto, a prevenção torna-se imperativa. Empresas e organizações têm um papel importante na criação de ambientes de trabalho saudáveis. Isso inclui a promoção do equilíbrio entre vida pessoal e profissional, a redução das expectativas irrealistas e o incentivo à procura de ajuda quando necessário. As instituições de ensino também podem desempenhar um papel importante ao educar os jovens sobre a gestão positiva do stress e a importância do equilíbrio na vida.
Não podemos mais ignorar a urgência de combater o esgotamento patológico. A nossa saúde mental é um recurso valioso que não pode ser negligenciado. Nunca é demais lembrar que somos mais do que as nossas realizações. Devemos abraçar a autenticidade e procurar um equilíbrio que nos permita prosperar não apenas no trabalho, mas também na vida. Esta síndrome de esgotamento profissional é um monstro invisível, que nunca deveria deixar de ser domado de forma consciente, pois com a saúde emocional não se brinca.
Agora que compreendemos a gravidade do problema, é hora de agir. Não podemos simplesmente esperar que o burnout seja apenas capa de revista. É essencial tomar medidas proativas para proteger a nossa saúde mental e bem-estar, a partir de ontem, basta de alimentar a indústria dos antidepressivos ou ansiolíticos.
O tempo é de alerta em tudo o que envolva situações de exaustão psicomental. Fica aqui e agora o convite para a reflexão e o pontapé de saída para conversas abertas sobre a saúde mental em qualquer lugar, seja no trabalho, em casa ou na sociedade em geral. É apenas através da compreensão, apoio e ação que poderemos evitar que outros caiam nas garras deste monstro silencioso.
Não devemos permitir que este monstro dite a lotaria das nossas vidas. É urgente construir sociedades mais saudáveis e equilibradas, onde a saúde mental é valorizada e protegida. Lembre-se, somos todos humanos, e a nossa sanidade vale mais do que qualquer conta bancária recheada de zeros à direita dos números, porque um dia seremos, na melhor das hipóteses, lembrados como números. Nunca é demais recordar Salvador Minuchin: “O burnout é uma chamada de alerta da mente e do corpo, pedindo uma pausa, uma mudança, uma chance de se reajustar”, para voltar a ser o que de melhor pode ser.
Luís Sinate
Pintura de capa por Edvard-Munch
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