Ao longo dos últimos anos temos testemunhado o deteriorar e o degradar das condições de atendimento e acompanhamento dos utentes no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Estamos perante uma situação grave e que revela a falta de resposta de uma instituição que tem como função assegurar e prestar cuidados de saúde dignos a todos os residentes e não residentes em Portugal. Mas o que é ainda mais preocupante é o impacto dessa situação na geração do futuro, a geração do amanhã, os jovens, que sentem “na pele” como isso afeta a sua vida pessoal, profissional e académica.
Durante o século XXI, e em especial nesta última década, temos vindo a assistir ao crescimento e ao eclodir de uma nova epidemia. Não, não falo da COVID-19, mas sim de uma epidemia silenciosa, que pode ser igualmente devastadora e mortal. Falo sim da problemática da saúde mental entre os jovens portugueses. Estamos perante uma crise em ascensão e os números não deixam margem para dúvidas.
Recentemente, um estudo da Associação Portuguesa da Clínica e da Saúde revelou que aproximadamente 20% dos jovens portugueses entre 15 e 24 anos enfrentam problemas de saúde mental, um dado preocupante que reflete o panorama atual. A situação piora quando consideramos os estudantes universitários. Segundo a Associação Nacional de Estudantes de Psicologia, quase metade dos estudantes universitários (48%) relata sintomas graves, incluindo depressão, ansiedade e burnout – uma estatística verdadeiramente catastrófica e calamitosa. Poderia estar a enumerar uma série de causas que nos levaram até este cenário negro e obscuro, mas deixemos esse tema para outra ocasião e foquemo-nos na ausência de respostas a este problema.
A resposta do SNS a esta crise é manifestamente desadequada e insuficiente, e há duas grandes lacunas que têm de ser urgentemente colmatadas e resolvidas: a falta de recursos humanos especializados no Serviço Nacional de Saúde e as longas e perpétuas listas de espera para acesso a uma consulta de especialidade, quer seja para psicologia ou para psiquiatria. Como é fácil entender e perceber, estas duas causas estão inevitavelmente interligadas e associadas entre si. Analisando os mais recentes dados da DECO PROTeste, o número de psicólogos e psiquiatras ao serviço da causa pública em Portugal é manifestamente inferior ao resto dos parceiros da OCDE e da União Europeia. O número médio de psicólogos por cada 5000 habitantes recomendado a nível internacional é de 1, sendo possível constatar que Portugal em nada cumpre estes requisitos, estando atualmente a média fixada em 1 psicólogo para 9700 habitantes, quase o dobro da média europeia. Infelizmente os números relativos aos profissionais da psiquiatria são igualmente desanimadores e diminutos. A nível internacional, novamente, é recomendado um rácio de 17 psiquiatras por 100.000 habitantes e o que vemos em Portugal mais uma vez? Uma falha grave no que concerne ao cumprimento desta norma. Estão neste momento disponíveis em média no nosso país, um irrisório e simbólico número de 13 psiquiatras por 100.000 habitantes. Com estes números que apresentei é fácil concluir o porquê das longas listas de espera que em muito ultrapassam o tempo desejável e aceitável de atendimento. Neste momento um doente muito prioritário adulto pode esperar até 97 dias para aceder a uma consulta da especialidade, enquanto a fasquia na psiquiatria infantil se situa nos 79 dias. Senhor Ministro da Saúde, Dr. Manuel Pizarro, falo directamente para si: Já pensou bem no caso de um jovem que esteja a frequentar o ensino superior, o que pode sofrer e perder durante quatro meses? Pode perder o mais importante de tudo, o seu futuro. E quando um jovem perde a hipótese de construir um futuro sólido e qualificado, perdemos todos. Perdemos enquanto país, perdemos enquanto sociedade e sobretudo perdemos enquanto nação, que necessita urgentemente de ser
rejuvenescida e valorizada.
Faço aqui um apelo ao Governo Português, para que não permita que a geração frequentemente apelidada de “mais qualificada de sempre” fique esquecida e caminhe para o abismo e para o precipício. Não precisamos de viagens na CP, nem de dormidas nas Pousadas da Juventude, precisamos de respostas a este problema urgente e crítico. É hora de reconhecer a gravidade desta crise, deixar de responsabilizar os utentes por esta situação e investir em prevenção, sensibilização pública e em recursos humanos robustos para fornecer uma resposta eficaz aos jovens e a todos os portugueses. O acesso ao tratamento de problemas do foro mental não pode ser um luxo e um privilégio, mas sim um direito que todos temos e o SNS tem que ser a base dessa resposta.
João Nuno
Imagem retirada de TSF Rádio Notícias
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