O futuro da Defesa Nacional: investimento ou serviço militar obrigatório?

"Impor um serviço militar obrigatório acrescentaria um fardo adicional a uma geração que já luta com atrasos significativos na sua trajetória de vida. Em vez disso, seria mais eficaz criar incentivos que tornem as carreiras militares atrativas, garantindo que o serviço nas Forças Armadas seja uma escolha voluntária e desejada."

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Nos domínios digitais, emergem conjeturas acerca da eventual reintrodução do serviço militar obrigatório, suscitando uma multiplicidade de perspetivas. Todavia, é imperativo atentar aos motivos subjacentes ao aparecimento dessas especulações. Num artigo publicado no Expresso1, a opinião do chefe do Estado-Maior da Armada (CEMA) é elucidativa: “Reequacionar o SMO ou uma variante mais adequada poderá ser uma medida necessária não só para equilibrar a relação despesa/resultados, mas também para gerar uma maior disponibilidade da população para a Defesa.”

O serviço militar obrigatório foi abolido em 1999, durante o governo do executivo socialista liderado por António Guterres, e teve o seu término definitivo em 2004, após um período de transição de quatro anos. Um artigo publicado no Público2 a 3 de abril, intitulado “Gouveia e Melo rejeita antigo Serviço Militar Obrigatório e pede ‘nova resposta’ consensual”, corrobora que o retorno do antigo serviço militar obrigatório não está em consideração e que terá de ser repensado.

A justificação para essas declarações prende-se com a escassez de pessoal nas Forças Armadas – uma situação que coloca Portugal em risco caso surja uma ameaça iminente. Embora a preocupação do chefe do Estado-Maior da Armada seja compreensível, considero que obrigar as pessoas a cumprir um período nas Forças Armadas não resolverá efetivamente os problemas existentes.

Em vez disso, acredito que a solução passa por tornar a profissão mais atrativa, valorizando as carreiras militares e aumentando significativamente o investimento na Defesa Nacional. Melhorar as condições de trabalho, oferecer oportunidades de progressão na carreira e proporcionar uma formação superior de qualidade são medidas que podem incentivar mais pessoas a ingressar voluntariamente nas Forças Armadas, assegurando assim a sua sustentabilidade e eficácia a longo prazo.

Os jovens em Portugal já enfrentam muitos desafios, desde a conclusão dos estudos até à obtenção da primeira habitação e ao nascimento do primeiro filho. Se fossem obrigados a cumprir um período obrigatório nas Forças Armadas, esses desafios seriam ainda mais agravados. Na minha opinião, esta situação seria insustentável.

Impor um serviço militar obrigatório acrescentaria um fardo adicional a uma geração que já luta com atrasos significativos na sua trajetória de vida. Em vez disso, seria mais eficaz criar incentivos que tornem as carreiras militares atrativas, garantindo que o serviço nas Forças Armadas seja uma escolha voluntária e desejada.

Atualmente, o investimento nas Forças Armadas corresponde a 2% do PIB, o que equivale a uma despesa de 2,8 mil milhões de euros, incluindo 533 milhões de euros destinados ao investimento em meios e equipamentos militares. No entanto, é evidente que a nossa Defesa continua pouco desenvolvida em comparação com outros países da União Europeia. Em 2023, Portugal não conseguiu alcançar a meta estabelecida pelo primeiro-ministro António Costa para esse ano, que era de 1,66% do PIB. De facto, o país investiu apenas 1,48% do PIB, ficando aquém do objetivo mínimo.

Sem um aumento significativo no investimento e uma maior eficiência na execução dos orçamentos, será impossível reverter a situação atual das Forças Armadas. O desafio não reside apenas no montante investido, mas também na capacidade de executar eficazmente os orçamentos disponíveis, garantindo que os recursos sejam utilizados de forma estratégica e eficiente.

É encorajador ver que este tema está a suscitar discussão sobre a nossa Defesa Nacional – um assunto frequentemente negligenciado. Muitos assumem que, por estarmos geograficamente afastados no canto da Europa, estamos a salvo de ameaças, mas a realidade é que o contexto geopolítico pode mudar rapidamente. Os últimos tempos mostram que nunca devemos assumir que estamos completamente seguros. Incentivar um debate contínuo sobre a Defesa Nacional é importantíssimo para assegurar que estamos preparados para qualquer eventualidade e para garantir a proteção e segurança do nosso país.

Em suma, a questão da reintrodução do serviço militar obrigatório em Portugal é um tema que suscita vastas discussões e perspetivas diversificadas. A preocupação expressa pelo chefe do Estado-Maior da Armada relativamente à escassez de pessoal nas Forças Armadas é legítima e merece atenção. Contudo, é preciso reconhecer que a imposição de um serviço militar obrigatório pode exacerbar os desafios já enfrentados pelos jovens portugueses, agravando os atrasos nas suas trajetórias de vida.


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21 anos, estudante de Contabilidade e Auditoria no Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Coimbra.

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