Ditadura dos bons princípios – Por que a individualidade deve prevalecer?

O fraco, incapaz de ser forte, constrói discursos onde o forte se torna arrogante, opressor, perigoso e capitalista. Assim, disfarça a sua própria impotência sob o manto da moral. E, num gesto subtil, faz com que a força seja vista como algo a ser combatido — e a fraqueza, como algo a ser enaltecido.

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Há uma moral que não precisa de se impor à força, porque se instalou como um sussurro constante dentro das pessoas. Ela diz: “sê bom”, “respeita tudo e todos”, “não ofendas”, “sê gentil”, “ajuda o próximo”. Princípios nobres e humanistas (seja lá isso de “humanistas” o que for. O Humano é, intrinsecamente nobre, é isso?), à primeira vista. Perigosos quando se tornam absolutos, porque, quando são exigidos em toda e qualquer circunstância, deixam de ser virtudes e passam a ser obrigações. E as obrigações, meus amigos, não libertam… Domesticam.

Essa moral do bem tornou-se um manual de conduta universal, que muitos seguem para evitar o desconforto de serem vistos como maus, duros ou insensíveis. Mas esse manual tem um custo altíssimo: a morte da individualidade autêntica. Porque, para ser aceite, o indivíduo precisa de suprimir o seu impulso, abafar os seus pensamentos originais, e muitas vezes mentir — até a si mesmo. Principalmente, a si mesmo.

A bondade, quando não é espontânea, é apenas obediência. E a empatia forçada é apenas medo, disfarçado de virtude.

Nietzsche já falava disso. A moral dos fracos nasce quando quem não tem poder decide que o poder é mau (uma natural defesa do Ego, visto que se eu não consigo ser daquela forma, então é mais fácil diabolizar aquilo). Quando quem não consegue impor-se (não no sentido de menosprezar o outro, mas reconhecer em si a sua força e aplica-la), decide que a virtude está na submissão. Assim, os fracos protegem-se: se todos forem nivelados (por baixo), ninguém poderá oprimir. E essa lógica — que começa como sobrevivência — transforma-se, com o tempo, numa ditadura moral. Não uma ditadura explícita, mas uma que atua de forma invisível, através de julgamentos sociais e coerções emocionais. Onde quem dita as regras da moral, são aqueles que, no fundo, não conseguem ser grandes em si, então mantêm-se pequenos em grupo.

A lógica do fraco diz que o melhor é juntar-se ao grupo, porque é no grupo que encontra segurança. O fraco, sozinho, não se consegue proteger — por isso, procura abrigo na multidão, onde se dilui e se sente menos vulnerável. A uma só voz, o grupo grita, impõe-se, exige respeito, clama por justiça. Mas é uma força de grupo, não é uma força de indivíduos.

O forte não precisa desse grupo. O forte não precisa de gritar, sequer. O forte é. A sua energia já é a da sua própria autoridade. Não autoridade para com o outro, mas autoridade em si, o seu próprio reconhecimento das suas capacidades. Ele não se esconde atrás de vozes coletivas, porque tem a sua própria. E é por isso que, no fundo, o fraco o inveja.

Mas essa inveja é disfarçada. Não se mostra como admiração, mas como ressentimento. O fraco, incapaz de ser forte, constrói discursos onde o forte se torna arrogante, opressor, perigoso e capitalista. Assim, disfarça a sua própria impotência sob o manto da moral. E, num gesto subtil, faz com que a força seja vista como algo a ser combatido — e a fraqueza, como algo a ser enaltecido.

É o triunfo da camuflagem moral: quando a incapacidade de se ser melhor enquanto pessoa se transforma em virtude. E a excelência, a capacidade de gerar, criar e fazer acontecer, em ameaça.

Hoje, somos ensinados a temer tudo aquilo que é forte, espontâneo, caótico, criativo ou incómodo. Somos ensinados a temer o indivíduo que pensa com a sua própria cabeça. Porque ele ameaça a ordem artificial dos bons princípios. Ele ameaça um sistema estabelecido, onde o que impera é a fraqueza de espírito ao invés da procura do crescimento, enquanto pessoa.

Mas a verdade é que a maior ameaça à humanidade nunca foi o indivíduo que pensa por si — foi o rebanho que deixou de pensar.

A individualidade não pode ser esquecida, não por egoísmo nem autoritarismo, mas porque sem ela estamos condenados a perder o poder criativo. Só quem se escuta pode criar algo novo. Só quem aceita a sua sombra pode amar de verdade. Só quem vive para além do medo de errar é capaz de experimentar a liberdade.

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Nasci em 1986, em Coimbra. Após formação em Informática de Gestão, vivi 12 anos como fotógrafo. Sempre escrevi sobre o mundo interno e externo, mas nos últimos anos mergulhei com mais foco na psicologia e na filosofia para entender o comportamento humano.

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