Estas palavras são de compreensão, integração e liberdade, no entanto, de repúdio por quem renega as suas origens.
Inacreditavelmente, ouvi duas vezes na mesma noite a expressão “sou do mundo!”, algo que já não me era dirigido desde 2006, em Frankfurt, no mundial de futebol. Nessa interessante cidade alemã, quando me recreava na fun zone deparei-me com um agradável cumprimento português, algo raro, pois em toda a semana de permanência só me apercebi de três portugueses.
Um jovem de português fluente, de t-shirt cava exibindo as suas tatuagens, os seus músculos prodigiosos e os óculos da moda, montava uma bicicleta muito in. De facto, quando lhe perguntámos de onde era, a resposta pareceu-nos à primeira vista também muito in: “Sou um cidadão do mundo”. Pena foi, passado poucos minutos, estar-nos a perguntar se queríamos comprar droga.
Recentemente, numa noite, um senhor condutor da Uber, com muito estilo, que até tinha vivido em quatro continentes, mas não tinha visitado mais de quatro países, e um senhor taxista utilizaram a mesma expressão para descreverem a sua origem: “Sou do mundo”.
Infeliz aquele que tem vergonha da sua origem, infeliz aquele que não tem nada de bom para contar da sua terra, da sua proveniência. Mesmo nestes tempos conturbados que a velha Europa atravessa, a nível de emigração, aquela expressão pode parecer à primeira vista muito erudita, mas é lamentável e deprimente.
O que enalteço é a minha origem, a minha cultura, a educação e a formação que os meus pais me proporcionaram, e não quero apagar isso em nome duma globalização, também necessária e importante, mas também desmedida e desrespeitadora dos valores e liberdades do outro. Quem se quer integrar deve também ser moldável, não pode impor os seus valores e tradições. Se não aceitar os valores e o estilo de vida dos destinos para onde se desloca, deve voltar ao seu ponto de partida.
Quando viajo também respeito a cultura dos países de destino. Por exemplo, em alguns países não pode haver manifestação de afeto, noutros não se pode beber bebidas alcoólicas de forma visível na rua, noutros não nos podemos fazer acompanhar de uma bíblia. Espero assim que outros quando chegam a Portugal não queiram impor alguns dos seus radicalismos.
Recordo, por exemplo, que alguns dos que chegam têm acesso gratuito e ilimitado a cuidados de saúde1, quando muitas das nossas comunidades do interior do país nem acesso à medicina têm. Recordo que o nosso SNS não vê credos, nacionalidades ou legalidade. Mesmo um indivíduo sem autorização de permanência, ilegal, portanto, usa os nossos recursos, num qualquer hospital e saí confortavelmente da unidade de saúde para continuar, quase, na clandestinidade.
Todas estas anteriores palavras foram escritas por mim em 2017, no entanto, com os acontecimentos deste início de 2025, quer a nível nacional, quer a nível internacional, estão cada vez mais atuais. Não fossem os projetos de lei aprovados pela AD e pelo Chega, em 19 de dezembro de 2024, estariam mesmo atuais.2
Talvez seja por tudo isto também que uma parte considerável da nossa comunicação social se mantém a fazer juízos de valor nas notícias que apresenta. Não conseguem compreender e aceitar, por exemplo, que a proporcionalidade de aproximadamente 168 milhões de pessoas vote de uma determinada forma no seu país (eleições americanas). Apenas criticam, não se questionando o porquê de tantos eleitores votarem democraticamente num insensato. Estes jornalistas querem impor a sua visão ideológica, não cumprindo o código de conduta da sua profissão. Não se limitam a informar, carregam de ódio e fel as palavras, as expressões faciais, o tempo de antena, o pseudo-respeito à democracia, etc.
Também no teatro, no cinema, no entretenimento, como sejam as simples telenovelas do horário nobre, esforçam-se por exibir as famílias desestruturadas, os comportamentos desviantes e os palavrões constantes, que levam à putrefação das mentes dos cidadãos portugueses, em especial os mais novos, com a justificação de transmitirem a realidade. Se é preciso ser assim para ser um cidadão do mundo, prefiro ficar-me pela terrinha…
Referências