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Sou a Alina, tenho 26 anos, sou ucraniana, mas desde pequena que Portugal é a minha casa. Durante cinco anos estudei para alcançar o meu maior sonho, ser arquiteta. Sempre fui uma aluna dedicada e estudiosa, com foco nos meus objetivos pessoais. A minha mãe sempre me incentivou a dar o melhor de mim, para ter uma vida de que me orgulhasse e um futuro confortável. 

Quando entrei no mundo do trabalho, em 2022, tudo deixou de ser o arco-íris que era no tempo de faculdade. É difícil entender e aceitar que, em Portugal, estudamos durante tantos anos para depois acabarmos a receber a remuneração mínima. Com justificações como: “és estagiária, ainda estás a aprender” ou “não te pagamos horas extra, mas tens de as fazer se queres ser alguém”. Foi uma altura em que senti uma extrema desilusão, e, por consequência, foi um tempo repleto de insónias, ansiedade e ‘stress’. 

Em conversa com amigas com quem estudei, comecei a perceber que existia um padrão nos gabinetes onde trabalhávamos. Por mais vezes que mudássemos de emprego, os problemas mantinham-se: câmaras municipais que demoram meses a dar resposta aos projetos, o que gerava insatisfação dos clientes; pressão psicológica por parte das chefias; e remunerações baixas. Juntando esses fatores à minha vontade de viajar e de conhecer o mundo, concluí que ficar em Portugal não me fazia sentido.

Nesta fase dediquei-me à procura de soluções. Fiz pesquisas sobre países de interesse, possíveis ‘ateliers’ para trabalhar fora de Portugal. Entretanto, uma amiga mostrou-me um perfil nas redes sociais sobre a vida na Austrália, com o visto de Trabalho e Férias1, que permite viajar e trabalhar na Austrália durante um ano, e disse-me “isto é mesmo a tua cara”. Desde esse dia, a minha pesquisa ganhou foco na Austrália: como obter o visto; quais os documentos necessários; como arranjar trabalho; que tipo de trabalhos podia fazer; e qual a cidade para dar início a esta aventura!  

A Austrália foi o meu país de eleição por diversas razões: a língua, que me deixava confortável por estar familiarizada; o clima, queria trabalhar num sítio com temperaturas agradáveis; a facilidade em obter o visto; a oportunidade de conhecer um país na outra ponta do mundo; e, por fim, os bons salários. O salário mínimo da Austrália é três vezes superior ao de Portugal, e, na minha experiência, considero o custo de vida relativamente idêntico.2

Entretanto, concluí o estágio que me dava entrada na Ordem dos Arquitectos. Em maio de 2023 acabou o meu contrato, que não renovei.  Em outubro do mesmo ano, apanhei o voo para a Austrália, sem viagem de regresso em vista. E, após dez meses neste país incrível, a trabalhar em áreas que nunca imaginei, como pecuária e hotelaria, reparo que as diferenças entre os dois países são evidentes. 

A Austrália é sem dúvida um país cheio de oportunidades. Com muita oferta de emprego e poder de compra superior. Do que noto ao meu redor, as famílias vivem em conforto. As identidades patronais preocupam-se com o tempo de qualidade em família e com o bem-estar dos trabalhadores. Até agora, a minha constatação é de que os superiores elogiam constantemente o empregador e o seu trabalho, traduzindo-se num sentimento de valorização que nunca senti antes. Palavras de motivação e agradecimento fazem parte do dia a dia. Tive constantemente a sorte e o privilégio de trabalhar em bons ambientes, rodeada de pessoas de várias nacionalidades, sempre muito carinhosas. Ao contrário de Portugal, o governo australiano tabela os salários mínimos por profissão3. Pelo que, enquanto em Portugal a maioria dos jovens decide ingressar no ensino superior, na Austrália poucos são os que seguem esse caminho.4

Posto isto, não há país perfeito para viver. Cada um tem as suas vantagens e desvantagens. A maior desvantagem para mim é, sem dúvida, estar a 16 mil quilómetros da família e amigos. Para além desta parte sentimental, faz-me falta a comida portuguesa, nada como o bacalhau e as suas mil e uma maneiras de o confecionar e a francesinha. Infelizmente ou não, não há muito mais que me traga saudade do meu país.

Quanto à experiência em si, só tenho pontos positivos a retirar: permitiu-me evoluir pessoal e profissionalmente; tive de me adaptar a situações fora da minha zona de conforto, de aprender muito em cada um dos sítios por onde passei, possibilitou-me evoluir o meu inglês; desfrutar de vivências únicas, como viver num sítio remoto com cangurus.

Para concluir, a Austrália foi o meu recomeço, o meu novo caminho em direção à felicidade. Não sei o que o futuro me aguarda, mas também não faço muitos planos. Apenas vivo e aproveito as possibilidades que a vida me oferece. Não me vejo a fazer este tipo de trabalhos a longo prazo, devido ao esforço físico, e às saudades de trabalhar na minha área, a desenhar casas bonitas e a criar espaços harmoniosos para as pessoas. Tenho o desejo de um dia trabalhar em arquitetura aqui na Austrália. É uma área bastante requerida, por isso quem sabe se um dia não terei a oportunidade de trabalhar num bom gabinete, oportunidade essa que Portugal não me proporcionou.


  1. Embaixada da Austrália, Portugal. (Setembro, 2014). Australia and Portugal sign Work and Holiday visa arrangement. Disponível em: https://portugal.embassy.gov.au/lbonportuguese/WrkHol.html ↩︎
  2. Fair Work Commission Australia. (2024). The national minimum wage. Disponível em: 
    https://www.fwc.gov.au/agreements-awards/minimum-wages-and-conditions/national-minimum-wage
    PORTUGAL.GOV.PT. (17 de Novembro, 2023). Governo atualiza Salário Mínimo Nacional para 820 euros em 2024. Disponível em: https://www.portugal.gov.pt/pt/gc23/comunicacao/comunicado?i=governo-atualiza-salario-minimo-nacional-para-820-euros-em-2024 ↩︎
  3. Payscale – Search Industry Salaries. Disponível em: https://www.payscale.com/research/AU/Industry ↩︎
  4. PORTUGAL.GOV.PT. (2 de Outubro, 2023). Portugal bate recorde de estudantes no Ensino Superior. Disponível em: https://www.portugal.gov.pt/pt/gc23/comunicacao/noticia?i=portugal-bate-recorde-de-estudantes-no-ensino-superior
    Statista. (5 de Abril, 2024). Share of population with a university degree in Australia 1989-2023. Disponível em: 
    https://www.statista.com/statistics/612854/australia-population-with-university-degree/#:~:text=Over%20the%20past%2020%20years,dropped%20to%20only%2032%20percent. ↩︎

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