A saúde mental não é só acerca de doenças

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“Deixa-te de coisas”; “Já pensaste em fazer umas férias?”; “Vai mas é sair com os amigos”; “Não tens motivos nenhuns para estar assim”, “Tens de dar a volta por cima”.

Ao contrário do que se possa imaginar, estas não são frases dirigidas a crianças ou adultos mal  comportados  ou birrentos.  Por mais incrível que possa parecer, estas são algumas das frases com que as pessoas que sofrem, por exemplo, de Depressão, Ansiedade, Perturbações Obsessivas ou outros tipos de Doença Mental, são brindadas ao longo da sua vida.

Podem até nem ser ditas com intenção de magoar ou ferir, mas ser desvalorizado naquilo que se sente acaba sempre por deixar algumas cicatrizes profundas de mágoa e estigma.

É curioso pensar: porque será que sempre que se fala de saúde, pensamos em doenças, quando por outro lado existem tantos aspetos da nossa saúde que temos tendência a desvalorizar?

Qualquer frase onde esteja incluída a palavra «Saúde» é para ser levada a sério e deve ser encarada como uma prioridade.

Seja a saúde física, psicológica, social ou espiritual, são várias as categorias onde se encaixam os parâmetros que definem quem está saudável ou quem está doente. Contudo, por vezes a fronteira entre saúde e doença é impercetível e fácil de ultrapassar. No entanto, apesar das suas várias categorizações, a saúde é só uma, funciona como um todo, e não diz respeito apenas à ausência de uma doença.

É por isso que “tratar da sua saúde” não diz respeito apenas ao «tratamento da doença». Pelo contrário, é muito mais abrangente, porque diz respeito também aos comportamentos preventivos e ao cuidado que se dedica à nossa saúde.

Mesmo assim impressiona-me a quantidade de vezes que dizemos “estou doente, tenho que tratar da minha saúde”. Nesse caso vamos “tratar a doença”, não vamos “tratar a saúde”. Da Saúde cuida-se diariamente, com persistência, consistência e, também, como tudo o que é valioso, com algum esforço e dedicação. Cuida-se antes de se estar doente.

Veja-se o caso da Saúde Mental, onde se enquadra o nosso bem-estar psicológico, emocional e social. Apesar de, segundo a Organização Mundial de Saúde, cerca de 790 milhões de pessoas (dez por cento da população) sofrer de algum tipo de problema de Saúde Mental, apenas dois por centro dos orçamentos governamentais para a Saúde se destinam a esta área. A desvalorização destas questões tem consequências importantes, na medida em que se sabe, por exemplo, que existe um aumento significativo da taxa de Suicídio, principalmente entre os jovens. É curioso que as crianças e os jovens se sintam cada vez mais infelizes no mundo atual dos adultos.

Mas estas questões não se resumem apenas às suas consequências diretas (maior taxa de absentismo escolar e profissional, aumento da taxa de suicídio, aumento do consumo de álcool e estupefacientes, diminuição dos índices de bem- estar). Os estudos mostram, com clareza, que as pessoas debilitadas por patologias de natureza mental envolvem-se com maior frequência em comportamentos de risco, têm tendencialmente hábitos de vida menos saudáveis (o que parece explicar em parte o aumento do consumo de álcool e drogas e a subida das taxas de obesidade), relações sociais, amorosas ou familiares mais desajustadas e têm maior probabilidade de

estarem envolvidos em percursos profissionais instáveis e mal remunerados.

Isto quer dizer que há uma associação entre a Saúde Mental e a Saúde Física, recíproca e válida nos dois sentidos. É por isso que, quando desvalorizamos a Saúde Mental, mais tarde ou mais cedo, a fatura será pesada e virá em nome da Saúde Física.

Por isso cuidar da Saúde Mental nunca poderá ser um capricho, algo de secundário ou meramente um luxo ao qual alguns se dedicam como forma de ocupar o seu tempo livre. Pelo contrário é um sinal de inteligência, que deve ser levado muito a sério, não apenas quando se “está doente”, mas antes porque “se quer manter saudável”.

Sendo um sinal de inteligência, procurar apoio profissional na área da Saúde Mental não é “uma coisa para doidos”.

No contexto dos cuidados e da dedicação com que é suposto tratarmos a nossa Saúde Mental, a Psicoterapia é uma ferramenta valiosa, da qual todos podem retirar benefícios, não só aqueles que “estão ou se sentem doentes”, mas também os que, apesar de se sentirem bem, “querem apenas evoluir  determinados aspetos da sua vida” ou querem apenas conhecer-se, ou manter-se saudáveis.

A Psicoterapia pode ser dura, mas é também promotora de mudança de padrões emocionais e comportamentais negativos e de aprendizagens que são duradouras e que se podem aplicar a novos desafios.

Ao contrário do que alguns pensam, não é uma simples conversa de café ou apenas para pessoas frágeis. Pelo contrário é uma prova de que se é forte, sendo um processo destinado a quem procura cuidar-se, evoluir e manter-se capaz e saudável, onde as pessoas se podem expressar livre e tranquilamente, sem estarem sujeitas a críticas, preconceitos, ou juízos de  valor.

É, acima de tudo, um caminho de descoberta pessoal, onde paciente e Psicoterapeuta caminham lado a lado, de forma segura e orientada, em direção à descoberta daquilo que de  mais profundo (e por vezes mais doloroso) existe na essência  humana. No fundo, são estas descobertas que nos fazem crescer e manter saudáveis.

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