Tempo de leitura: 4 minutos

O mês de setembro de 2024 trouxe mais uma tragédia ao nosso país, com cerca de 135 mil hectares de floresta a ardida, vidas perdidas e dezenas de feridos[1]. Este não é um incidente isolado, mas sim um padrão que se repete ao longo dos anos. A situação é grave e levanta uma questão essencial: quem é realmente responsável por tudo isto?

A responsabilidade começa com aqueles que ateiam fogo, mas o problema vai além disso. Os incêndios são alimentados por constantes falhas e negligências. Em primeiro lugar, a falta de cuidado com os terrenos, que não são limpos nem mantidos, é um fator importante que agrava a situação. É inaceitável que as autarquias locais, conscientes do perigo iminente de certas áreas, não atuem para salvaguardá-las.

Lamentavelmente, muitos autarcas optam por dedicar-se a festividades que asseguram apoio eleitoral, em vez de implementar mecanismos de apoio para a conscientização da população sobre a importância da prevenção de incêndios. Além de promover essa sensibilização, deveriam criar mecanismos eficazes para auxiliar na limpeza dos terrenos de pessoas que, devido a problemas de saúde incapacitantes ou à falta de capacidade física, não conseguem cuidar dos mesmos.

O Governo também tem a sua quota de responsabilidade, evidenciando uma preocupante desconexão com a realidade das nossas florestas. A atuação apenas após a ocorrência de tragédias, como os grandes incêndios florestais, tem-se revelado uma prática recorrente e ineficaz, que raramente resulta em soluções concretas e sustentáveis. Esta abordagem reativa, onde as medidas só são implementadas após os danos estarem consumados, expõe a falta de um planeamento estruturado e contínuo por parte das autoridades, refletindo a ausência de uma estratégia preventiva sólida.

A gestão dos incêndios não pode ser encarada como uma medida opcional ou de recurso apenas em situações de emergência, mas sim como uma necessidade essencial que exige uma coordenação eficiente entre todos os intervenientes, incluindo as autarquias, a proteção civil e os proprietários rurais, com o objetivo de mitigar os riscos antes de se tornarem catástrofes.

É urgente fazer uma reforma na propriedade rústica que aborde os terrenos abandonados e as heranças que não têm dono. Precisamos de incentivos para plantar espécies autóctones e de um ordenamento do território que funcione. A atualização das cartas de perigosidade é fundamental para compreender os riscos que enfrentamos. A floresta deve ser encarada como um recurso valioso que necessita de investimento e de uma gestão adequada, não apenas focada no retorno financeiro, mas que também integre investimentos com impactos sociais, ambientais e económicos, alinhados com os valores pessoais e os objetivos a longo prazo.

Ademais, é fundamental valorizarmos os nossos bombeiros, que estão na linha da frente no combate aos incêndios. Estes profissionais, que arriscam diariamente as suas vidas para nos proteger, merecem uma carreira digna, com um salário justo e a formação adequada. Não podemos permitir que trabalhem sem as condições necessárias para atuarem de forma eficaz em situações de emergência, nem que sejam exaltados como heróis apenas durante o verão, para depois serem esquecidos no resto do ano. Esta desvalorização contínua, agravada pela falta de apoio às associações de bombeiros voluntários, é um reflexo da negligência do Governo, que falha em garantir os recursos e o suporte necessário a quem tanto faz pelo país.

Um governo que não implementa esta visão preventiva, que desvaloriza o trabalho dos bombeiros e falha em alocar os recursos necessários, está a negligenciar as suas responsabilidades fundamentais e a permitir que tragédias evitáveis continuem a acontecer.

Se não houver uma mudança séria e urgente na forma como as autarquias e o Governo encaram a gestão do território, continuaremos a assistir a tragédias cada vez mais devastadoras. É fundamental sensibilizar a população, mas essa responsabilidade não pode ser apenas dos cidadãos.

De que adianta a conscientização coletiva, se aqueles que detêm o poder para agir continuam a falhar em implementar medidas eficazes? Até quando vamos permitir que a inércia das autoridades ponha em risco as nossas vidas e o nosso património natural? Quantas tragédias mais teremos de suportar antes que algo verdadeiramente mude?

É urgente que a sociedade civil se una e exija ação e responsabilidade de todos os envolvidos. Precisamos de promover mudanças que garantam um futuro mais seguro e sustentável para todos. A nossa floresta e os nossos bombeiros merecem ser tratados com dignidade e respeito. Não podemos esperar mais. A hora de agir é agora.


[1] Lusa. (2024, 21 de setembro). Cerca de 135 mil hectares ardidos entre domingo e sexta-feira. Sábado. Disponível em: https://www.sabado.pt/portugal/detalho/cerca-de-135-mil-hectares-ardidos-entre-domingo-e-sexta-feira

Partilha este artigo:

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.