Setembro marca, para muitos, o fim das férias e o regresso às aulas. Para milhares de jovens portugueses, é também o início de um novo capítulo nas suas vidas: o ingresso no ensino superior. Este momento representa o primeiro contacto com a vida adulta e, possivelmente, o início do caminho para o seu futuro profissional.
Todos os anos, este mês assinala o recomeço de rotinas académicas. Para quem já está no ensino superior, setembro é um mês de reencontros e de regresso a horários habituais. Para os que iniciam esta etapa, especialmente aqueles que mudam de cidade e enfrentam uma nova realidade universitária longe de casa, este é um dos momentos mais desafiantes e tensos, tanto para si, como para os seus pais.
O ensino superior é visto como a última fase do percurso académico para a maioria dos estudantes portugueses. Uma etapa crucial para a conquista de um diploma, seja ele uma licenciatura, mestrado, ou doutoramento. No entanto, este percurso, muitas vezes, exige sacrifícios pessoais e familiares consideráveis.
Num país onde a pobreza continua a ser uma realidade persistente, cerca de 11% da população ativa vive em situação de pobreza1, os “novos pobres”, aqueles que, apesar de terem emprego, se deparam com salários baixos ou condições laborais precárias, ou ambas, inúmeras famílias veem-se incapacitadas de fazer face às despesas mensais. A entrada de um filho no ensino superior, para estas mesmas famílias, representa um enorme impacto financeiro, inviabilizando a frequência e continuidade dos estudos no ensino superior.
Para muitos, a universidade é a chave para quebrar o ciclo de pobreza e precariedade. Num Portugal onde os apoios sociais são escassos, insuficientes e muitas vezes mal distribuídos, o ensino superior é, ou deveria ser, uma via de ascensão social.
No entanto, a mera sugestão de descongelar as propinas, para as aumentar, agrava a exclusão daqueles que menos têm, bloqueando o elevador social, e perpetuando a estagnação económica e social de várias gerações.
Não se trata de discutir o mérito da existência de propinas, mas sim de constatar uma realidade óbvia: sem um sistema de apoio social forte e eficiente, aumentar o valor das propinas penaliza exatamente quem mais precisa e depende da proteção do Estado. E, num país que se quer virado para o futuro, isto é o oposto daquilo que deveria ser a prioridade política de qualquer Governo.
Não se pode justificar, nem fundamentar, a ideia de que a autonomia das instituições de ensino superior está intrinsecamente ligada à existência de propinas. Tal argumento cria uma falsa dependência das universidades, tanto científica como material, que nunca deveria existir. Além disso, tenta legitimar um aumento de propinas com a ideia de que o Estado pode, embora não deva, interferir na autonomia funcional e material das instituições de ensino superior.
Não podemos, enquanto sociedade, aceitar que a imperfeição do sistema social leve à exclusão dos mais desfavorecidos. O aumento das propinas a ser, sequer, equacionado, apenas haveria de o ser quando existissem garantias de que nenhum estudante seria excluído do ensino superior devido à sua condição financeira. Um estudante afastado dos estudos, por não ter meios de pagar propinas, representa um fracasso coletivo. Um estudante nesta situação não é mais um, é um a mais. E esse número devia ser absolutamente zero.
Até que possamos assegurar que ninguém fica para trás por razões financeiras, qualquer alteração nas propinas só deveria ter uma direção: a descida.
- Diogo, F. (coord.). (2021, abril). Faces da Pobreza em Portugal. Fundação Francisco Manuel dos Santos. P. 15. Disponível em: https://www.ffms.pt/sites/default/files/2022-07/faces-da-pobreza-em-portugal.pdf ↩︎
Pintura de capa por Columbano Bordalo Pinheiro
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