Olhando para aquela que foi a maneira como terminei o último artigo, onde fazia uma antevisão ao Euro 2024, eu diria que as duas afirmações sobre as quais me inclinei com mais segurança acabaram por se tornar factuais. A história é sempre o melhor indicador de como as coisas podem correr, e, por vezes, parece que as histórias se repetem.
A Inglaterra voltou mais uma vez a iludir tudo e todos. De acordo com os próprios ingleses, sempre houve uma certeza (sem fundamento, sendo que nunca ganharam um) de que o maior troféu europeu de seleções ‘was coming home’. Alguma sorte no sorteio desenhou o caminho perfeito para os Três Leões chegarem à tão desejada e inédita vitória no Olympiadstadion, mas esta acabou por não acontecer, como o resto do mundo já previa. A outra afirmação que fiz foi defender que o anfitrião não tinha hipóteses algumas de vencer, pois, conforme a tradição, desde 1984 que a história assim o dita. A Mannschaft ainda proporcionou grandes momentos ao longo de junho e julho, mas Toni Kroos iria mesmo acabar a sua carreira sem mais nenhum troféu – não que precisasse para uma carreira recheada deles.
Apenas uma coisa a Inglaterra teve em comum com a seleção alemã neste Euro. Ambas caíram às mãos do mesmo protagonista. Por vezes, falamos de pressão e do quão bem funciona quando uma equipa não sente a necessidade de ter resultados. Creio que seja isto que aconteceu com a Espanha neste campeonato da Europa, aliado ao facto de que é o segundo torneio internacional de seleções (após a vitória argentina no campeonato do mundo, em 2022) em que o treinador da equipa vencedora é alguém que já acompanha o grupo de jogadores desde as seleções mais jovens.
Lionel Scaloni entrou nos esquadrões da seleção argentina em 2017 como treinador adjunto, mas, passados três meses, foi eleito para dirigir o plantel sub-20 da Albiceleste, onde, desde cedo, mudou algumas ideias de jogo. O seu trabalho com os jogadores mais novos permitiu que eles pudessem crescer, como o grande caso de Julián Álvarez, e trabalhar mais entrosados com esta nova estrutura de jogo, já com Scaloni como treinador principal, em agosto de 2018.
A Espanha seguiu a mesma fórmula e provou de igual resultado. Luis de la Fuente chegou ao comando do principal plantel espanhol após passagens consecutivas nos sub-18, sub-19 e sub-21, onde acompanhou grande parte do jovem talento ibérico que vimos brilhar este verão. Diria que só Lamine Yamal não passou pelas mãos do técnico campeão europeu, e isto foi porque, em 2014, quando de la Fuente assumiu os sub-18, Yamal tinha apenas sete anos.
Com isto, chego ao cerne da questão e começo a colocar dúvidas quando olho para aquela que foi a prestação da seleção das quinas neste campeonato da Europa. Mais uma vez, um pouco ao estilo da seleção inglesa, o mediatismo tomou controlo do rumo da equipa. Após um arranque fenomenal com seis pontos, mesmo com um pouco de sorte à mistura – dois erros que nos deram a reviravolta contra a Chéquia e um autogolo fora deste mundo contra a Turquia –, fomos o primeiro país a assegurar o topo do grupo e a respetiva qualificação. Assim, Roberto Martínez decidiu rodar e dar oportunidade ao restante plantel contra a Geórgia, mas acredito que isto tenha sido o princípio do fim.
Como bem sabemos, o futebol internacional é claramente afetado por duas necessidades fundamentais que um treinador precisa de cumprir: a primeira é, obviamente, de resultados; a segunda, de saber gerir personalidades e tudo o que gira à volta das mesmas. Até agora, creio que o treinador da seleção ainda não conseguiu resolver a segunda parte. Vimos o que aconteceu em 2022, que acabou por ditar a saída do ex-treinador e vencedor do Euro 2016, Fernando Santos. Uma autêntica cópia. Duas vitórias nos primeiros dois jogos. Seis pontos. Terceiro jogo, equipa rodada, uma derrota desnecessária. E, a partir daí, apenas um tema abordado: Ronaldo.
Não é o nosso primeiro nem segundo dia na Terra. Bem sabemos quem é, a sua história e o quão gigante é a marca CR7. Apesar de todo o drama que envolveu o seu nome no mundial de 2022, no Qatar, Cristiano ainda marcou por cinco vezes e conseguiu calar aquelas que eram as críticas vindas de fora. Não foi o caso deste Euro. Zero golos, uma assistência (o passe para o lado para o golo de Bruno Fernandes contra a Turquia) e um totalista em termos de minutos, tendo apenas sido substituído no único jogo que não interessava, contra a Geórgia. Foi desapontante para todos os portugueses. Podemos debater aqui a possibilidade de este plantel ser um dos melhores de sempre à disposição da seleção, mas a verdade é que o espírito competitivo de Cristiano Ronaldo desta vez não levou a melhor.
Creio que existem momentos em que, ao olharmos para trás, percebemos que há que dar lugar ao próximo e, por vezes, apenas esta demonstração de confiança faz a diferença no desempenho do colega. Penso num futuro hipotético sem o atual jogador do Al-Nassr, com ideias de uma equipa mais dinâmica e jovem. Após a saída da seleção do Euro 2024, falou-se numa possível necessidade em haver uma conversa entre Roberto Martínez e Cristiano Ronaldo, com o intuito de decidir o seu futuro. Esperemos, então, para perceber se vamos entrar na nova era do futebol português.
Pintura de capa por Van Gogh
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