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Se há algo que aprendi ao longo do tempo é que o desporto espelha a vida. Espelha os seus altos e baixos, a forma como as pessoas lidam com eles, e como veem um atleta.

Não vou falar de um modo técnico de futebol, mas sim da realidade desportiva. Este Euro teve inúmeras situações que foram muito além do desporto em si. Temos um plantel cheio de talento e ficámos pelo caminho, com uma exibição ou outra mais bonita, porém com pouquíssimos golos. No fundo, fomos muitas vezes medíocres e os jogadores foram mal geridos. Mas o que pretendo aqui ressaltar é o modo como reagimos, tendo isto em conta, na qualidade de adeptos.

Foi muitas vezes confundido meritocracia com respeito ao legado do Cristiano Ronaldo, que não foi tratado como um jogador comum (eu sei que não o é). Os jogadores mostrarem as suas capacidades era secundário, quase que ganhar não era a prioridade, mas sim que o Ronaldo marcasse um golo. Forçar esta situação ainda me pareceu uma forma mais injusta de lidar com a carreira deste jogador, e dos outros, mesmo que a presença do Ronaldo em campo se reflita também noutras situações importantes.

Porém, o que mais me marcou foi a forma como reagimos em momentos menos bons de atletas: o caso do António Silva e, mais recentemente, do João Félix. Culpar um jogador pela derrota e outro pelo fim do Euro é tão mesquinho e pequeno como a mentalidade portuguesa. O João Félix entra a frio para marcar um penálti, falha, e a culpa é dele? Depois de 120 minutos, sem golos, nos quais não participou nem em um?

O penálti é sempre um risco e, correndo bem ou mal, não reflete qualidade. Uma seleção deste calibre não devia sequer depender de um momento destes para se apurar, no entanto, aconteceu novamente e desta vez correu mal. Fomos uma seleção bastante medíocre em todo o percurso, sem razão para sê-lo.

Eu não consigo ver um atleta que enfrenta um momento desta dimensão, falha, e achar que não vale nada. Embora possa parecer um pouco contraditório, tendo em conta que estou a cobrar a seleção pela falta de resultados, não acho que sejam jogadores sem valor. 

De repente, o João Félix já não é a promessa do futebol português, é só um puto cheio de mania, e só se deu bem no Benfica, tudo porque falhou um penálti, uma questão de segundos, após ninguém ter feito nada de jeito durante 120 minutos? Não parece ilógico? Pois bem, é assim que vejo quem critica o jogador, aplicando-se também a António Silva: uma mente pequena. 

Quem tem esta opinião nunca enfrentou um desafio igual, nem consegue compreender quem enfrenta – provavelmente a decisão mais difícil que tomaram foi entre o conforto e o maior conforto. Gostam da infelicidade dos outros, e têm um prazer especial, como se lhes aquecesse o coração, ver falhar quem é bem-sucedido e até tem algum dinheiro. Não sou só eu que falho, pensam eles, enquanto dormem em posição fetal. 

É tão pequeno que, sabendo o quanto um penálti afortunado calava muitos maldizentes, depois de alguns momentos de carreira menos bons, vamos criticar um atleta bastante jovem que decidiu não se acobardar atrás dos outros, e assumir a oportunidade e o risco. O mesmo serve para António Silva, que foi completamente arrastado para a lama por um jogo menos bom, apesar daquilo que já mostrou ser.

Não acho que foi um bom Euro, mas, desde que me lembro, o futebol é um jogo coletivo com um treinador que toma decisões (bastante infelizes, mas isso fica para outra altura). Culpar dois jogadores que nem 25 anos têm é ridículo e taberneiro. Temos de ser melhores.

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