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Eu não sei quem sou – o nome de uma das primeiras músicas que escrevi e, talvez, a primeira vez que, de forma aberta, revelei ao mundo aquilo que eu não era, mas que gostaria de ser.

Agora, pensando melhor, reconheço que nem eu próprio sabia o que gostaria de ser nessa altura, talvez por não saber quem era sequer. O mais certo é ninguém ter ouvido falar dessa música, embora ainda circule por aí. Contudo, o que interessa é que só por ser mencionada neste texto voltou a ganhar vida.

Tal como escrevi, eu não sei quem sou. Não sabia quem era quando escrevi esse verso. Agora, sei um pouco mais, é verdade, mas à medida que o tempo passa, a necessidade de o descobrir é um bafo que me aquece o pescoço. Sei que está lá, embora não o consiga ver; sei que está perto, mas ao mesmo tempo longe.

A música é algo que está presente em mim desde muito cedo. Felizmente, a excelente teimosia dos meus pais em inscrever-me, a mim e ao meu irmão, no Conservatório de Música Jaime Chavinha, em Minde, foi uma das melhores decisões que poderiam ter tomado na vida; aliás, na minha vida. Sem dar por isso, abriram-me uma porta que jamais ousarei fechar. É por causa dessa decisão que hoje estou mais perto de sacudir o bafo quente que há tanto tempo me persegue.

Hoje, perto dos 25 anos, atrevo-me a dizer que eu, Ricardo Neto, quero ser músico profissional. É nas cordas gastas e sedosas, nos trastes rasgados pelas palavras que canto, que consigo estar mais perto de quem sou. Até lá, sou músico semiprofissional, tal como o meu amigo Tomás Lacerda, o guitarrista da minha banda, gosta de me fazer lembrar.

Sim, vou aproveitar este espaço e estes curtos minutos em que vos tenho para publicitar, como sempre faço, a nossa banda. Somos os Maria Café! Nome peculiar, eu sei, e que deixa água na boca. Porquê Maria Café? Se não estivessem já a pensar nisso, agora aposto que estão! É uma história maravilhosa que um dia irei contar, mas não será hoje.

Contudo, se por um lado estou mais perto de saber quem sou, por outro, sinto que estou cada vez mais distante. Sou músico semiprofissional à data destas palavras, mas por que razão não consigo ser mais? Neste momento já podia estar a viajar de norte a sul do país com a minha banda, a tocar nas ruas e ruelas, nos palcos pequenos e gigantes das maravilhosas vilas e cidades que nos rodeiam. Porque não acontece? Qual a razão de estarmos atualmente a mandar dezenas de ‘emails’ por mês em busca de apenas uma pessoa que nos diga que quer os Maria Café? Tem sido uma busca constante que, por vezes, não vou mentir, cansa e me faz querer desistir.

Acredito que o mercado nacional esteja muito fechado neste momento. Sei que podem estar a pensar que é falta de talento, porém tenho a certeza que não é isso. No nosso caso, e talvez outros na mesma situação partilhem da mesma opinião, está a faltar um elemento crucial: não é o talento, mas sim a sorte. No nosso país, e da maneira como o panorama está, precisamos de um pouco de sorte para dar o passo seguinte. As agências de música estão completamente lotadas e a busca por um lugar está cada vez mais difícil e competitivo.

Um exemplo prático do que estou a dizer acontece onde estamos sediados. Somos uma banda de Aveiro, cidade que me acolheu e onde vivo desde 2017, e é aí e nos seus arredores que os nossos videoclipes são gravados. Somos próximos da comunidade e tentamos sempre levar a cidade a todos os locais onde atuamos, nunca deixamos de a celebrar, bem como os seus costumes e tradições, enaltecendo tudo aquilo que a região tem para dar.

Este ano, Aveiro é a capital portuguesa da cultura, existindo até uma plataforma ‘online’ para celebrar este marco tão importante. “O ano como palco, um cenário infinito” é o mote utilizado para embelezar o feito. Porém, nós, Maria Café, não estamos incluídos neste cenário. Se dizem que é infinito, leva-nos a pensar que existem oportunidades para todos, no entanto, infelizmente, não é o que sucede. Alguns dos muitos ‘emails’ que enviámos foram para a Câmara de Aveiro, e acabaram perdidos num mar de tantos outros que tentaram a sua sorte e que nem sequer obtiveram resposta.

Sou o primeiro a dizer que não existe espaço para todos e as oportunidades devem ser equilibradas, e sendo nós uma banda de Aveiro com dezenas de originais, que valoriza a sua terra, que canta em português, prestes a lançar o nosso segundo ‘single’, não deveríamos ter um pequeno espaço no “cenário infinito”? Estamos juntos desde 2022, já tocámos em vários locais na cidade e arredores, nunca com o apoio das grandes instituições – sempre através daqueles que acreditam em nós e que nos dão oportunidades para crescermos mais um pouco. Estamos aqui. Iremos continuar a crescer aos bocadinhos, até que o bocadinho se transforme no todo.

Hoje, tentei escrever uma canção – quem sabe se será esta a trazer-nos a sorte, a que nos ajudará a dar o próximo passo, a dar o próximo Salto Alto?

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